quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

CARTA DA BAHIA




CARTA DA BAHIA

As ações de políticas afirmativas, que reparam a invisibilidade e legitimam espaços de atuação reivindicatória e valorização da cultura afro-brasileira, foram iniciativas de organizações e grupos que compunham o movimento negro. A partir destas iniciativas, que surgiram em prol da reconstrução de uma educação que busca contemplar a diversidade étnico-racial, modificar a visão eurocêntrica que exclui a cultura, a história e valores civilizatórios africanos e afro - brasileiros.
Organizações sociais culturais de Salvador, a revelia dos poderes públicos, através de atitudes pioneiras, implementaram em algumas escolas comunitárias e também em escolas públicas municipais e estaduais uma educação que abrange a diversidade cultural. Na década de 90, estas ações foram incorporadas pela rede pública de Salvador.
Atualmente, dando continuidade a essas iniciativas, o Governo Federal aprova a lei nº. 10.639/03 que obriga os sistemas de ensino a incorporarem a temática de História e Cultura Afro-Brasileira.

No período de 09 a 11 de agosto 2005, no Centro de Convenções da cidade de Salvador - Bahia, por iniciativa do Ministério da Educação, através da SECAD, foi realizado o Fórum Estadual “Educação e Diversidade Étnico-Racial”, com a participação do Governo do Estado da Bahia, Secretarias Municipais, Instituições Públicas , Quilombos Urbanos Educacionais, Instituições de Ensino Superior, Entidades Sindicais, Lideranças Políticas, Representantes de Comunidades Remanescentes de Quilombos, Movimentos Negros, Organizações Não Governamentais, e Educadoras(es) de várias regiões do Estado, quando estiveram discutindo questões relativos à educação com foco na questão étnico-racial. A presente CARTA registra nossas interpretações, anseios, demandas e proposições de eqüidade para efetiva valorização da diversidade racial.

Identificamos as principais lacunas no tocante a essa temática:
1) Evasão escolar, provocada pela falta de identificação dos valores simbólicos culturais dos alunos relacionados ao cotidiano escolar;
2) Formação do/a educador/a, falta de comprometimento institucional e a omissão do governo estadual, reforçam a formação para uma educação eurocêntrica;
3) Falta de oportunidades e acesso, dos docentes, em discussões e aplicação da Lei n. 10639/03 em todas as disciplinas inclusive Matemática, Química, Física;
4) Carência de infra-estrutura para implementação da 10.639/03 - material didático específico e recursos humanos;
5) Participação efetiva do Conselho Escolar na implementação da 10.639/03;
6) Falta de orçamento direcionado a implementação da 10639/03;
7) Desarticulação entre as instâncias que deveriam implementar a 10.639/03;
8) Inexistência de disciplina específica e obrigatória nos cursos de licenciatura que dê formação para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana;
9) Limitação do conhecimento da Lei n. 10639/03 face à pouca divulgação;
10) Falta de espaços dialógicos e/ou físicos favoráveis às realizações de linguagens pluriculturais que simbolizem os valores civilizatórios africano-brasileiros;
11) Veto do parágrafo 3º do art. 79-A da Lei n. 10639/03, “relacionado à formação do professor”;
12) Currículo eurocêntrico e universalista.

Para superar algumas dessas lacunas, propomos:
1) Criação e legitimação do Fórum Permanente de Educação e Diversidade Étnico-Racial, a partir da aprovação pela plenária da CARTA DA BAHIA e que as Secretarias de Educação, Estadual e Municipais, tenham um órgão específico para tratar da implantação e aplicabilidade da 10.639/03.
2) Criação da Secretaria Estadual de Promoção da Igualdade Racial;
3) Envolver as(os) gestoras(es) para que atuem na implementação da lei;
4) Criar Políticas Públicas de ações afirmativas voltadas para valorização da diversidade étnico-racial, dentro da escola, conforme a 10639/03, Parecer CNE/CP 003/2004 e CNE/CP Resolução 1/2004;
5) Criação de programas de formação inicial e continuada de gestores/as de ensino, e professores/as em parcerias com o MEC, IES e demais instituições utilizando meios eletrônicos, correios e outros, presenciais e a distância, envolvendo todas os sistemas de ensino público e particular;
6) Fazer formação da comunidade escolar – todo corpo docente, discente e funcionários técnico/administrativo - especialmente do Conselho Escolar para resgate da identidade afro-brasileira e africana ;
7) Capacitação de professores de todas as áreas para implementação da Lei 10.639/03, definindo metodologias de ensino, nas diversas linguagens, particularmente nas áreas das ciências exatas e biológicas;
8) Produção de materiais didáticos: cartilhas, jornais, vídeos, CD’s, DVD’s, livros, jogos, bem como apoio a projetos de pesquisa que propiciem a produção desses materiais;
9) Obrigatoriedade da inclusão da Lei 10639/03 nos Projetos Políticos-Pedagógicos das escolas, através de ações do Conselho Estadual de Educação ou das instâncias municipais congêneres;
10) Estabelecer uma rede de comunicação entre as Secretarias (Estadual/Municipais) e as entidades envolvidas com a educação e o fórum permanente;
11) Criação de uma rede, envolvendo todos os fóruns estaduais;
12) Promover a reforma curricular nos Sistemas de Ensino Superior nos cursos de licenciaturas;
13) Divulgar as diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais e para o “Ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana” nos meios de comunicação através de debates, seminários e materiais didáticos;
14) Estabelecer convênios com movimentos sociais e movimentos negros para aplicação da Lei 10639/03, bem como assegurar o aproveitamento dos trabalhos desenvolvidos por professores/as das redes;
15) Engajamento da SEPPIR no processo ativo de implementação da Lei 10639/03, interagindo em todos os Estados;
16) Criação de espaços dialógicos e físicos nas linguagens pluriculturais que simbolizem os valores civilizatórios indígenas, africanos e brasileiros;
17) Legitimar a grande experiência e o conjunto de conhecimento produzido e acumulado pelo movimento negro, conforme o Parecer CNE/CP 003/2004;
18) Proposta de reformulação curricular com base na diversidade enunciada pela Lei, interagindo para a implementação de um currículo plural.
19) Criação de Políticas públicas, levando em conta as especificidades regionais, para viabilização da Lei 10.639/03;
20) Promover a articulação do Fórum Estadual com o PCRI – Programa de Combate ao Racismo Institucional;
21) Premiar iniciativas de destaque na implementação da Lei 10639/03, dando ênfase ao prêmio com nomes de intelectuais e personalidades de destaque negros/as;
22) Propor emenda aos orçamentos da Assembléia Legislativa e Câmaras Municipais para viabilizar recursos para implementação e cumprimento da Lei 10639/2003.

Salvador/BA, 11 de agosto de 2005.

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